[CamaraDas] Adultos infantilizados e o Consenso de Washington

  • From: João Stenzel <joao_stenzel@xxxxxxxxxxxx>
  • To: analistas2002@xxxxxxxxxxxxx
  • Date: Mon, 25 May 2009 06:17:44 -0700 (PDT)

Correio Braziliense 25/05/2009
Brasil S/A
Papel do Estado

O Consenso de Washington não morreu

Por Ricardo Allan
ricardoallan.df@xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx 
O brasileiro se acostumou a olhar para o Estado como um filho indolente enxerga 
o pai complacente. Não importa o tamanho da bobagem que faça ou da paralisia em 
que se enfiou, espera sempre que uma mão paterna lhe tire dos apuros e afague 
sua cabeça. É mais confortável do que amadurecer e enfrentar os próprios 
problemas. Isso vale para empresas e pessoas físicas. As companhias se 
habituaram a um capitalismo estatal, em que o risco dos grandes é absorvido 
pelo Tesouro. O trabalhador acredita que o governo deve consertar o que há de 
errado em sua vida ou comunidade. 

O filósofo inglês Thomas Hobbes (1588-1679) criou a figura do monstro Leviatã 
para ilustrar sua tese contratualista. Incapazes de prover sua segurança 
sozinhos, os homens abriram mão de parte da liberdade individual em nome da 
proteção do Estado. Sem ele, suas instituições, leis e sanções, viveríamos num 
permanente estado de guerra, onde o mais habilidoso prevaleceria sobre o mais 
débil na luta pela sobrevivência. A barbárie, enfim. O objetivo primordial do 
Estado, portanto, seria garantir a paz social. Mas a burocracia, um dia 
nascida, passou a ter como mantra a própria sobrevivência. 

Em algumas nações, com raízes mais fincadas no individualismo e no espírito 
capitalista, companhias e cidadãos assumem, em geral, seus riscos e problemas. 
A não ser que a encrenca seja tão grande que ponha em risco a economia de todo 
o país, como se vê agora com o Tesouro norte-americano ninando montadoras e 
bancos quebrados. No Brasil, onde as pessoas foram embaladas pela mãe-preta sob 
a sombra da frondosa mangueira, a ordem é outra. Se o Estado é grande demais, 
vamos nos valer dele. Ele tem a obrigação de prover empregos a todos, manter 
empresas públicas, ajudar as privadas e prestar serviços de qualidade. Tudo 
isso cobrando poucos impostos. 

Adultos infantilizados 
O cargo de ministro da Fazenda do Brasil deve ser um dos mais maçantes do 
mundo. Tem desafios inerentes num país acostumado à inflação alta e ao baixo 
crescimento. A chatice vem de aguentar, quase todo dia, a choradeira de 
empresários. Não há um único setor da economia brasileira que não se considere 
merecedor de um auxílio qualquer do Estado: um corte de impostos aqui, um 
dinheiro do BNDES ali e por aí vai. Os campeões no aluguel dos ouvidos 
ministeriais são as montadoras de automóveis, os produtores rurais, as empresas 
de construção civil, de infraestrutura, de bens de capital e do ramo 
eletroeletrônico. Sem falar no lobby das federações e confederações 
empresariais. 

O trabalhador comum não tem acesso aos gabinetes oficiais. Se pudesse reclamar, 
teria um rosário de razões, principalmente quanto ao estado deplorável da 
segurança pública, saúde e educação. Mas a intenção de muitos é outra. É 
mergulhar nas entranhas do monstro. Quando eu comecei a trabalhar, não mais do 
que 18 anos atrás, a regra era procurar emprego nas empresas privadas. Entrar 
para os quadros públicos era a exceção. Hoje, milhares de brasileiros se formam 
e não vão trabalhar. Enquanto continuam a viver do suor do papai, adultos 
infantilizados gastam anos a fio fazendo concursos. Viram “concurseiros”. Como 
se isso fosse profissão. A própria existência dessa palavra é uma excrescência. 

O Estado brasileiro precisa de uma faxina geral. Para livrá-lo dos políticos 
ladrões, dos governantes despreparados, das unhas de empresários buscando 
privilégios, dos juízes e policiais corruptos, dos servidores preguiçosos, da 
leniência, da cumplicidade, do jeitinho... A alegação de que tudo isso são 
traços culturais, culpa ou não da nossa carga genética ibérica, não exime 
ninguém. Não adianta botar a culpa no outro – mais um esporte nacional. O 
Estado brasileiro é assim porque os eleitores votam, eleição após eleição, em 
gente que reproduz os mesmos esquemas viciados. É só olhar para o Congresso. E 
o eleitor, quando tem a chance, também mete a mão no que acha ser seu de 
direito, mas não é. 

Social-liberal 
Num país com as necessidades sociais do Brasil, defender a adoção de um Estado 
liberal é irreal. Mas é preciso tê-lo como modelo, mesmo que platônico. Na 
reunião do G-20, o primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, anunciou o fim do 
Consenso de Washington. No centro do picadeiro, queria agradar o venerável 
público. Com exceção de países dominados por figuras ridículas, como os três 
patetas sul-americanos (Hugo Chavez, Evo Morales e Rafael Correa), ninguém 
defende a irresponsabilidade fiscal, inflação, alta carga tributária, juros e 
câmbio artificialmente fixados, fechamento do país a importações e 
investimentos estrangeiros, reestatização de empresas e desrespeito à 
propriedade. 

O temido Consenso de Washington advoga justamente o contrário de tudo isso. 
Portanto, não está morto. Está vivíssimo. O único ponto que a crise parece ter 
suspendido foi o da desregulamentação. Mas trata-se apenas da volta do pêndulo. 
Regulamenta-se agora, afrouxa-se depois. O único exemplo de proposta liberal 
vencedora no Brasil foi a de Fernando Collor. Quase tudo que se fez depois 
seguiu boa parte daquelas diretrizes. De forma geral, o Estado deve se 
encarregar de segurança, saúde e educação de qualidade, dando igualdade de 
condições para as pessoas competirem no mercado de trabalho. 

Deve ter programas sociais para quem ficou de fora, mas estimular a previdência 
privada. Deve criar condições macroeconômicas e institucionais para o 
desenvolvimento. Deve vender (caro) empresas como Banco do Brasil, Petrobras, 
Eletrobrás e Correios. Elas servem à corrupção. Deve ter um número reduzido de 
servidores, mas chegar onde não está hoje: favelas e periferia. Deve se ocupar 
de quem precisa dele, metendo-se o menos possível na vida dos demais. Em suma, 
um Estado social-liberal. 


Ricardo Allan é repórter de economia 



      Veja quais são os assuntos do momento no Yahoo! +Buscados
http://br.maisbuscados.yahoo.com

Other related posts:

  • » [CamaraDas] Adultos infantilizados e o Consenso de Washington - João Stenzel