Tourinho foi ministro de janeiro de 1999 até fevereiro de 2001, depois vieram, respectivamente, José Jorge e Pedro Parente. Realmente parece ser dele a maior parte da "culpa". Entretanto parece que o estigma do "apagão" ficou mesmo com JJ. Vejam os textos abaixo... SALTO NO ESCURO (21/08/01) Ex-ministro afirma que governo não investe em energia e coloca privatização como maior vilã da crise Racionamento é culpa de FHC, diz Tourinho HUMBERTO MEDINA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA O governo Fernando Henrique Cardoso deixou de investir em energia desde 1995 e houve erro no modelo de privatização. As acusações são do ex-ministro de Minas e Energia Rodolpho Tourinho. Ele foi demitido do cargo por FHC no começo do ano, após desentendimentos do presidente com o ex-senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA), que o indicou para o cargo. "Todo o governo sabia da fragilidade do sistema elétrico desde o blecaute de 1999", disse. Embora não tenha sido citado nominalmente no relatório da Comissão de Análise do Sistema Hidrotérmico, ligada ao "ministério do apagão", Tourinho pode ser considerado culpado porque a comissão atribui ao Ministério de Minas e Energia durante sua gestão a principal responsabilidade pela crise de energia elétrica. De acordo com Tourinho, o governo sabia, por meio da Eletrobrás, que precisava investir R$ 8,5 bilhões por ano para manutenção e ampliação do sistema elétrico. "Mas o orçamento da Eletrobrás só dava para R$ 2,3 bilhões." Segundo ele, a Eletrobrás recomendava, desde 1996, que se aumentasse em cerca de 3.000 megawatts por ano a capacidade instalada no país. "Mas, de 1995 a 1998, no governo FHC, a média foi de 1.660 megawatts por ano." O ex-ministro disse que, na sua gestão, iniciada em janeiro de 99, a capacidade instalada aumentou para 4.700 megawatts em 2000. Tourinho afirma que, desde o início do governo FHC, foi feita metade das linhas de transmissão recomendadas pelos relatórios técnicos da Eletrobrás. Ele contesta o modelo de privatização adotado. "Não podia privatizar geração porque era preciso investimento. Mas, mesmo assim, o governo colocou as geradoras no PND [Programa Nacional de Desestatização" e elas não puderam mais investir", disse. A intenção era substituir o investimento estatal pelo privado, mas só as distribuidoras -que não produzem energia- foram vendidas. Tourinho criticou o relatório elaborado pela comissão, coordenada pelo diretor-presidente da Agência Nacional de Águas, Jerson Kelman. "É uma coleção de obviedades", disse ele. Procurado, Kelman informou, por meio da assessoria, que não iria se manifestar. SALTO NO ESCURO (27/07/01) Informação contradiz relatório da GCE FHC sabe o que se passa nas Minas e Energia, diz ministro José Jorge DA SUCURSAL DO RIO O ministro de Minas e Energia, José Jorge, afirmou ontem que o presidente FHC toma conhecimento de todos os fatos importantes que acontecem dentro do ministério. Segundo ele, nenhum ministério tem autonomia em relação ao presidente. A informação contradiz o resultado do relatório da GCE (Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica), o "ministério do apagão"), que analisou as causas do racionamento. O documento aponta o ex-ministro Rodolpho Tourinho como principal responsável pela crise do setor elétrico. Ele não teria informado adequadamente FHC sobre o baixo nível dos reservatórios. Questionado como seria possível o presidente não saber da crise, José Jorge respondeu: ""Não me cabe julgar o presidente". E completou: ""Há coisas em meu ministério que nem eu sei". José Jorge disse ainda que não é possível culpar uma ou duas pessoas por uma crise como a energética. Ele reiterou a informação do relatório de que é preciso investir na expansão da capacidade de geração de energia brasileira. A GCE está estudando a formação de um leilão que garanta a compra de energia de térmicas pela Eletrobrás. Em duas semanas, será definido o modelo do leilão e o volume de energia que será adquirido pela estatal. 10/06/01 Tourinho faz dossiê sobre crise energética e protege FHC FERNANDO RODRIGUES ENVIADO ESPECIAL A SALVADOR Enquanto seu padrinho político, o ex-senador Antonio Carlos Magalhães, ataca o presidente da República um dia sim e no outro também, o ex-ministro de Minas e Energia Rodolpho Tourinho toma outro caminho: preparou um extenso dossiê sobre a crise energética para contar uma história semelhante à divulgada pelo Palácio do Planalto. Tourinho vai além. Em entrevista à Folha na tarde de sexta-feira, fez o que pôde para não constranger Fernando Henrique Cardoso e a equipe econômica. "Não sou político", diz o ex-ministro. Aos 59 anos, o economista que foi ministro de Minas e Energia de janeiro de 99 a fevereiro deste ano tem opinião idêntica à de FHC: o problema maior da crise atual é a falta de chuva. As 103 páginas de seu dossiê contêm inúmeras tabelas e gráficos que explicam em parte como o Brasil entrou na atual barafunda energética. Não é uma história que exime FHC e sua equipe de culpa. Mas dilui a responsabilidade para todos os presidentes desde 87, ano a partir do qual houve uma queda brutal dos investimentos no setor elétrico do país. Tourinho poupa FHC até no que considera um dos erros do atual governo -sem nunca pronunciar a palavra "erro"-, que foi não ter resolvido o problema do preço do gás para as 49 termelétricas anunciadas em fevereiro do ano passado. O governo ficou com medo de prometer aos investidores que o preço do gás importado, em dólar, seria compensado com o reajuste nas tarifas quando houvesse desvalorização do real. O ex-ministro diz ter recebido o apoio de Armínio Fraga (presidente do Banco Central) e de Pedro Parente (ministro da Casa Civil) na discussão do risco cambial do gás. Sobre o presidente, diz que FHC entendia do assunto. O máximo de crítica que se permite é uma citação velada ao ministro da Fazenda, Pedro Malan: "Por que a equipe econômica demorou a ver isso?". Nada mais. Ataque mais direto só para a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), única entidade identificada por Tourinho como frontalmente contra o regime de proteção cambial para o gás importado. Tourinho diz não guardar mágoa do presidente da República. Mesmo depois de ter sido demitido de forma humilhante, por meio de uma nota distribuída à imprensa, ainda produziu um dossiê que poderia ser muito útil ao governo nas explicações sobre a crise energética. Pelo menos, tem mais informações nessas 103 páginas do que em todas as declarações dos integrantes do "ministério do apagão". A seguir, os principais trechos da entrevista do ex-ministro: Folha - O sr. já disse que avisou o presidente da República sobre o risco de crise. Por que ele diz ter sido surpreendido? Rodolpho Tourinho - Eu separaria duas coisas. A crise estrutural era conhecida de todos. Já os dados sobre os reservatórios preparados pelo ONS [Operador Nacional do Sistema Elétrico" não continham ainda em dezembro de 2000 informações específicas sobre a crise que estava para começar. E é inegável que o nível das chuvas deste ano é o mais baixo dos últimos 70 anos. Folha - O plano de construir 49 termelétricas e gerar até 12 mil MW novos empacou por causa da falta de solução para o risco cambial do preço do gás. Por que esse assunto demorou tanto para ser solucionado? Tourinho - Era uma questão política. A Aneel estava contra. Entidades empresarias estavam contra também. Folha - Quem era a favor e quem era contra a adoção da correção cambial? Tourinho - Eu era a favor. Era a única saída que dispúnhamos para suprir o país com energia no curto prazo, recuperando o déficit acumulado no passado recente. Eu sempre disse que o programa das termelétricas era apenas uma ponte até que o Brasil resolvesse o "gap" existente entre oferta e demanda. Folha - Sim, mas quem no governo foi contra oferecer a correção cambial? Tourinho - A Aneel era contra. Mas não havia uma pessoa ou outra entidade específica contrária. O problema era mesmo político. O ministro da Casa Civil, Pedro Parente, era a favor. O presidente do Banco Central, Armínio Fraga, era a favor. Folha - Mas e o presidente? E o ministro da Fazenda? Tourinho - Nas reuniões, ninguém era contra. Havia apenas dois problemas que precisavam ser resolvidos. Um deles era o político. O outro era o Plano Real, que impedia a indexação em dólar. Folha - E houve alguma solução proposta? Tourinho - Depois de muita discussão, os investidores concordaram em não receber o reajuste trimestral. Ficou tudo para o que se chama de "tracking account", que é a forma de carregar o custo de uma eventual desvalorização e fazer um acerto ao final de cada ano. Folha - No seu dossiê sobre a crise de energia elétrica, o sr. relata que houve uma reunião de investidores com o presidente da República no dia 4 de julho do ano passado. Ali, ficou mais ou menos tudo acertado. O presidente da República não tomou providências depois dessa reunião? Tourinho - O presidente tinha conhecimento do assunto, mas o que aconteceu é que havia apenas uma proposta a ser encaminhada. O problema não estava superado. Talvez por problemas políticos. Havia ainda divergências dentro do governo. Folha - O sr. poderia explicitar essas divergências? Tourinho - Não posso identificar exatamente quem era contra ou a favor. Mas as medidas não saíram. Acho que acabaram politizadas. Apareceu nos jornais como dolarização de tarifa. Folha - E não era dolarização? Tourinho - Em parte. Você teria uma parcela muito pequena, apenas na conta de uma distribuidora que comprasse energia de uma termelétrica. Como a imensa parte da energia produzida no país é hidráulica, o impacto seria pequeno. Num cálculo em que houvesse desvalorização cambial de 10% num ano, o impacto seria de apenas 1% a 2% na tarifa do ano seguinte. Folha - O presidente FHC disse que a capacidade de geração do país aumentou, em média, 3.100 MW por ano desde 95. Os números do seu dossiê são diferentes. Por quê? Tourinho - Não sei. De 95 para cá houve um aumento médio anual de aproximadamente 2.500 MW na capacidade de geração. Pouco para a necessidade do país. Mas isso não é o mais grave. O problema é que o pico foi nos últimos dois anos. Nos anos anteriores, de 1995 a 1998, houve um déficit grande acumulado, com um aumento sempre apenas entre 1.000 e 2.000 MW.