|Nefelibatas| Do Veríssimo

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  • Date: Thu, 31 Mar 2005 10:47:45 -0300

 
26/3/2005 - 20:28:44
'Presque'

'Presque' (Por Luís Fernando Veríssimo - de O Globo)

A internet é uma maravilha, a internet é um horror. Não sei como a Humanidade 
pôde viver tanto tempo sem o e-mail e o Google, não sei o que será da nossa 
privacidade e da nossa sanidade quando só soubermos conviver nesse 
syberuniverso assustador. O mais admirável da internet é que tudo posto nos 
seus circuitos acaba tendo o mesmo valor, seja receita de bolo ou ensaio 
filosófico, já que o meio e o acesso ao meio são absolutamente iguais. O mais 
terrível é que tudo acaba tendo a mesma neutralidade moral, seja pregação 
inspiradora ou pregação racista - ou receita de bomba - já que a linguagem 
técnica é a mesma e a promiscuidade das mensagens é incontrolável. Não temos 
nem escolha entre o admirável e o terrível, pois acima de qualquer outra coisa 
a internet, hoje, é inevitável. 

Uma das incomodações menores da internet, além das repetidas manifestações que 
recebo de uma inquietante preocupação, em algum lugar, com o tamanho do meu 
pênis, é o texto com autor falso, ou o falso texto de autor verdadeiro. Ainda 
não entendi o recato ou a estranha lógica de quem inventa um texto e põe na 
internet com o nome de outro, mas o fato é que os ares estão cheios de 
atribuições mentirosas ou duvidosas. Já li vários textos com assinaturas 
improváveis na internet, inclusive vários meus que nunca assinei, ou assinaria. 
Um, que circulou bastante, comparava duplas sertanejas com drogas e aconselhava 
o leitor a evitar qualquer cantor saído de Goiânia, o que me valeu muita 
correspondência indignada. Outro era sobre uma dor de barriga desastrosa, que 
muitos acharam nojento ou, pior, sensacional. O incômodo, além dos eventuais 
xingamentos, é só a obrigação de saber o que responder em casos como o da 
senhora que declarou que odiava tudo que eu escrevia até ler, na internet, um 
texto meu que adorara, e que, claro, não era meu. Agradeci, modestamente. 
Admiradora nova a gente não rejeita, mesmo quando não merece. 

O texto que encantara a senhora se chamava "Quase" e é, mesmo, muito bom. Tenho 
sido elogiadíssimo pelo "Quase". Pessoas me agradecem por ter escrito o 
"Quase". Algumas dizem que o "Quase" mudou suas vidas. Uma turma de formandos 
me convidou para ser seu patrono e na última página do caro catálogo da 
formatura, como uma homenagem a mim, lá estava, inteiro, o "Quase". Não tive 
coragem de desiludir a garotada. Na internet, tudo se torna verdade até prova 
em contrário e como na internet a prova em contrário é impossível, fazer o quê? 

Eu gostaria de encontrar o verdadeiro autor do "Quase" para agradecer a glória 
emprestada e para lhe dar um recado. No Salão do Livro de Paris, na semana 
passada, ganhei da autora um volume de textos e versos brasileiros muito bem 
traduzidos para o francês, com uma surpresa: eu estava entre Clarice Lispector, 
Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira e outros escolhidos, adivinha com 
que texto. Em francês ficou Presque .

Por Editoria <mailto:pessoas@xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx> 


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