O espetáculo do desenvolvimento Como o caixa do PT cresceu 240% nos últimos três anos RICARDO MENDONÇA 15/12/03 Juca Martins/Olhar Imagem 1980 O partido de Lula (no centro) cresceu à base de voluntarismo e improvisação Promessa feita ao país em junho passado, o 'espetáculo do crescimento' de Luiz Inácio Lula da Silva até agora só se realizou mesmo foi no PT. De 2000 para cá, sua receita cresceu 240%, passando de R$ 24,3 milhões para R$ 83 milhões. Apenas neste ano, a arrecadação do PT aumentou quase 40% - desempenho realmente espetacular num país que deve fechar o ano com crescimento econômico praticamente nulo. A bolada que o PT levantou equivale ao dobro do orçamento do Ministério dos Esportes ou à soma das receitas dos outros 26 partidos juntos. O Partido dos Trabalhadores sempre se destacou dos outros por ser o mais organizado, mesmo quando era pequeno. Hoje continua sendo o mais organizado, está no poder e é o mais rico de todos. 'OPT virou uma máquina partidária sem paralelo no cenário político nacional', afirma o cientista político Rui Tavares Maluf, da Unicamp. Sob o comando do ex-deputado José Genoíno, presidente da sigla, o dinheiro é usado apenas para tocar o dia-a-dia das atividades partidárias. Não se mistura com as doações para candidatos, que só aparecem em ano eleitoral. Fotos: Sérgio Dutti/ÉPOCA LUXO Prédio onde está a nova sede do PT em Brasília e Genoíno na sala de reuniões do escritório Na semana passada, o PT deu mais uma amostra de como está cada vez mais requintado. Depois de anunciar a contratação de Duda Mendonça para cuidar da campanha para a reeleição da prefeita Marta Suplicy em São Paulo no ano que vem, a direção do partido bateu o martelo sobre a contratação do publicitário Nizan Guanaes para fazer a campanha de Jorge Bittar pela prefeitura do Rio de Janeiro. Com isso, o PT terá coordenando campanhas municipais os dois mais caros e vitoriosos marqueteiros políticos do país - aqueles que ganharam as últimas três eleições presidenciais. Guanaes trabalhou nas vitórias de Fernando Henrique Cardoso, em 1994 e 1998, e Duda ajudou a eleger Lula no ano passado. A contratação simultânea de Duda e Guanaes faz parte de uma estratégia agressiva para o ano que vem. Em várias áreas, o partido de origem operária que cresceu à base de improvisação e voluntarismo começa a dar impressionantes sinais de profissionalização. Os mais relevantes: A direção do PT está promovendo seminários sobre organização de campanha e confecção de plano de governo em todos os Estados da Federação, iniciativa inédita no cenário político. Já foram realizados 18 eventos do gênero e até janeiro haverá outros nove. De abril a maio está programada uma segunda bateria de encontros com mais um evento por Estado. Cada seminário, ministrado por especialistas em marketing político e publicitários, reúne cerca de 300 militantes e pré-candidatos. De olho nas eleições de 2004, a sigla acertou que vai fazer até quatro pesquisas nacionais sobre o humor do eleitorado e contratar levantamentos de intenção de voto em 250 municípios 'estratégicos'. Todo candidato petista numa cidade com mais de 150 mil eleitores terá pesquisa própria para orientar a campanha. 'Os donos dos institutos dizem que nunca se fez algo parecido com isso no Brasil', afirma o tesoureiro do PT, Delúbio Soares. Numa campanha inédita de filiação deflagrada há pouco mais de três meses, o partido espalhou 1.500 outdoors em 52 cidades, preparou um filme para a TV e um jingle para o rádio (veiculados no horário gratuito) e está distribuindo 3 milhões de adesivos. O retorno da campanha, que conta até com telefone 0800 para adesões, são 140 mil novas inscrições até agora. A tesouraria do PT está terminando uma licitação para a compra de 7 mil computadores de última geração que serão instalados em todos os diretórios municipais petistas. Cada micro virá acompanhado de um software desenvolvido só para as necessidades partidárias, minicâmera, para a realização de conferências pela internet, fax e impressora. Em 2004, o PT será o único partido 100% informatizado. n Há poucos meses, o PT trocou seu escritório em Brasília por um maior e mais moderno num edifício empresarial. No ano que vem, também vai trocar a sede em São Paulo por um imóvel mais confortável. O círculo virtuoso petista não é só econômico. Desde 2001, o total de filiados saltou de 300 mil para 540 mil. 'Trabalhamos com a perspectiva de atingir 800 mil em 2004', informa o secretário de organização, Silvio Pereira. O total de diretórios municipais também disparou: pulou de 2.500 para 5.338, uma cobertura de 96% do território nacional. Em 11 Estados, o PT já está presente em 100% dos municípios. Com tamanha estrutura e caixa recheado, alguns petistas entusiasmados chegam até a arriscar metas numéricas para o próximo pleito. É o caso dopresidente da Câmara, João Paulo Cunha, que fala em conquistar 850 municípios, uma enormidade perto dos 187 que o PT fez em 2000. Genoíno e Pereira são mais cautelosos. Não citam números, mas não deixam de demonstrar otimismo: 'Eleição não é aritmética. Vamos trabalhar para obter uma vitória política', diz Genoíno. 'Será uma vitória se o PT conseguir manter a hegemonia nas capitais, onde estamos bem, e avançar nas cidades pequenas, onde somos pequenos', afirma Pereira. A DISPARADA PETISTA O tamanho do PT em dinheiro equivale à soma dos 26 partidos. Confira a evolução das receitas das quatro maiores siglas em valores atualizados - em R$ milhões 1997 - metade do 1º mandato de FHC 2000 - metade do 2º mandato de FHC 2003 - 1º ano do governo Lula PMDB 20,1 19,5 17,7 PT 17,3 24,3 83 PSDB 15,4 29,0 20,3 PFL 13,8 22,3 17,7 Fonte: partidos A explicação para a disparada econômica petista está numa conjunção de fatores que favoreceu muito o partido nos últimos anos. O PT tem quatro fontes de renda e todas têm crescido. A mais polêmica delas está no artigo 171 de seu estatuto: a contribuição obrigatória de políticos e filiados que ocupam cargos de confiança em governos petistas. Batizada de 'dízimo', ela varia de 2% a 20% do salário líquido do petista, dependendo do salário que recebe. Trata-se de uma fonte de renda que se agigantou com a vitória de Lula e tende a crescer ainda mais, já que o PT não nomeou nem um terço dos 35.560 cargos de confiança que passou a ter com a chegada ao poder. Um assessor de ministro que ganha R$ 6 mil por mês, por exemplo, paga 10% à sigla por meio de uma autorização de débito em conta. Isso multiplicado por governos, gabinetes e estatais já rende R$ 15 milhões por ano ao PT. A contribuição é obrigação apenas dos petistas. O ministro Márcio Thomaz Bastos, por exemplo, não é filiado e por isso não precisa dar nada ao partido. Metade das recentes nomeações, porém, é de contribuintes. Esse dízimo sempre existiu no PT, mas, quando a sigla era pequena, seus adversários não ligavam. Hoje, reclamam com veemência: 'Em cada nomeação do governo ficará a suspeita de que ela não se deu por competência, mas só para engordar os cofres do PT', reclama o ex-presidente do PSDB José Aníbal. A deputada Yeda Crusius (RS), também tucana, e o senador pefelista José Jorge (PE) têm até projeto de lei para barrar a cobrança. 'O PT usa uma brecha para se apropriar de recursos públicos', diz Yeda. 'A cobrança não é ética e está criando um brutal desequilíbrio entre os partidos', afirma Jorge. Outro crítico severo é o deputado Raul Jungmann (PPS-PE), quelevou ao procurador-geral da República, Cláudio Fonteles, uma representação contra a prática. Entusiasta do dízimo, Genoíno minimiza: 'Isso é falta de assunto da oposição, pois ninguém é obrigado a ser petista', diz. Segundo ele, a única punição que existe para o filiado inadimplente é a perda do direito de votar nas eleições internas da legenda. A ORIGEM DO DINHEIRO DO PT (em %) Dízimo pago pelos demais filiados 47,7 Fundo Partidário 27,6 Dízimo pago por políticos e funcionários no governo 18,1 Doações e venda de materiais do partido 6,6 Apesar do barulho, o dízimo de políticos e comissionados não representa 20% da arrecadação do PT. De acordo com a prestação de contas da sigla, quase metade da receita petista tem origem num outro tipo de dízimo: a cobrança de 1% do salário dos filiados comuns, ou seja, estudantes, funcionários públicos concursados e trabalhadores da iniciativa privada que resolveram entrar no partido. Nesse caso, o que há é um grande mérito do PT, pois o partido fez o que nenhum outro conseguiu: recadastrou e sabe exatamente quem é e onde está cada um de seus associados. Até 1999, o PT juntou 980 mil fichas de inscrição em seus diretórios. Apesar do estatuto dizer que todos são obrigados a pagar, pouquíssimos pagavam, pois boa parte dos nomes da lista já tinha saído do PT, outros não participavam e alguns tinham até morrido. Quando a sigla resolveu fazer eleição direta interna, teve de providenciar uma enorme campanha de recadastramento. Desse rapa, finalizado em 2001, sobraram 300 mil nomes, mas desta vez com endereço completo, telefone e valor do holerite. 'A cobrança ficou mais fácil e a receita cresceu', conta Delúbio. A arrecadação teve ainda mais um impulso relevante em 2002, durante a campanha eleitoral, período em que mais 100 mil se filiaram e passaram a pagar a taxa. A terceira razão para o enriquecimento do PT foi o desempenho do partido nas eleições de 2002. Além de vencer a disputa presidencial, o PT saltou de 58 para 91 deputados federais e se transformou na maior agremiação da Câmara. Com isso, passou a receber a maior fatia do Fundo Partidário, um montante de R$ 114 milhões distribuído pelo Tribunal Superior Eleitoral aos partidos na proporção de cada bancada. Como nenhuma outra sigla grande cobra dízimo, o Fundo Partidário representa quase 100% das receitas de todos. No caso do PT, porém, os R$ 22,9 milhões do TSE são apenas 27,6% da previsão de arrecadação. Isso ninguém discute. Quanto custa ser petista RICARDO MENDONÇA SER PETISTA CUSTA CARO O PT recebe até 20% do salário líquido de seus filiados naquilo que poderia ser chamado de IPP, Imposto Progressivo Petista Regra para os filiados em geral Regra para os políticos eleitos pelo PT Regra para quem é nomeado no governo Se a pessoa recebe Tem de pagar Se a pessoa recebe Tem de pagar Se a pessoa recebe Tem de pagar Nada, pois está desempregada Nada, está isenta Até R$ 1.200 6% DO SALÁRIO Até R$ 1.440 2% do salário Até R$ 720 R$ 5 por ano De R$ 1.201 a R$ 2.400 8% do salário De R$ 1.441 a R$ 2.400 3% do salário De R$ 721 a R$ 1.440 0,5% do salário De R$ 2.401 a R$ 3.600 11% do salário De R$ 2.401 a R$ 3.600 5% do salário Acima de R$ 1.441 1% do salário* De R$ 2.401 a R$ 3.600 16% do salário De R$ 3.601 a R$ 4.800 8% do salário Acima de R$ 4.801 20% do salário** Acima de R$ 4.801 10% do salário * Esse era o caso de Lula antes de ser eleito ** Esse é o caso do presidente Lula hoje NickeLeus L. P. Zemborian Presidente do P.R.F