Quinta-feira, 25 de maio de 2006 Pág. Política PSDB e PFL brigam pelo mesmo eleitor Maria Inês Nassif O PFL rompeu nas eleições passadas com o aliado de dois governos consecutivos e retoma agora a aliança com pouca convicção e muito incômodo. Setores importantes do partido debitam unicamente à verticalização - a obrigação de reproduzir a mesma aliança nacional nas eleições estaduais - a decisão de caminhar junto com os tucanos nesse pleito. Existem razões para isso, tanto políticas como de ordem interna. A maior razão é a política. Nas eleições de 2002, primeiro por conveniência eleitoral e depois por exigência do mercado financeiro, o PT deu uma forte guinada ao centro. Um governo guiado pelos compromissos assumidos com investidores acabou consolidando a posição de Lula e de seu partido no espectro de centro-esquerda. Isso empurrou o PSDB, por sua vez, mais à direita - e os tucanos acabaram invadindo o espaço eleitoral do PFL. Hoje, na avaliação interna de setores importantes do partido dirigido pelo senador Jorge Bornhausen (PFL-SC), há uma canibalização eleitoral dos dois aliados. Ambos estão correndo na mesma raia, o que ameaça o PFL no que é o seu cacife, uma grande bancada no Congresso Nacional. Nas últimas três eleições isso já era fato: o PSDB garantiu boa parte de sua bancada federal com o apoio do eleitorado conservador do Sudeste e o PFL debita sua grande força na Câmara e no Senado ao eleitor do Nordeste com o mesmo perfil ideológico. A caminhada do PSDB acirra a disputa dos dois aliados pelo mesmo eleitor. Desse ponto de vista, a escolha de Alckmin, segundo avaliação de líderes pefelistas, restringe as chances da aliança voltar ao Palácio do Planalto, já que ideologicamente ambos estão aprisionados ao apoio dos mesmos eleitores. Dirigentes do PFL não estão felizes com Alckmin Internamente, o processo de escolha de Alckmin criou sérios problemas. Os senadores Jorge Bornhausen e Marco Maciel gastaram todas suas capacidades ofensivas e paciências, desde que o partido foi criado, para neutralizar o poder de pressão do senador Antonio Carlos Magalhães (BA). ACM teve e tem, tradicionalmente, a maior bancada individual do Congresso: leva com ele a cada eleição um séquito de leais correligionários baianos, que lhe dão um poder próprio dentro da agremiação mesmo alijado do poder decisório do partido nacional. Nos últimos anos, aproveitando também uma lenta decadência do líder baiano em seu quintal político, a direção tem conseguido imprimir uma certa organicidade às decisões partidárias, apenas administrando os ímpetos individualistas de ACM. O grupo Marco Maciel-Jorge Bornhausen tinha simpatias pela candidatura do tucano José Serra à Presidência, convencido de que as posições do ex-prefeito paulista, mais afinadas com a esquerda, pudessem empurrar novamente o parceiro do centro ideológico para uma posição um pouco mais à esquerda. Com isso, estaria se agregando votos à candidatura da aliança e, ao mesmo tempo, as legendas deixariam de disputar os mesmos eleitores para os outros cargos. A escolha de Alckmin não apenas complicou o arranjo ideológico como fortaleceu a posição de Antonio Carlos Magalhães internamente. Atribui-se a vitória da candidatura Alckmin sobre a de Serra a uma articulação entre o presidente do PSDB, Tasso Jereissati, e o senador do PFL baiano. O apoio de ACM ao ex-governador teria sido levado à cúpula do tucanato como o trunfo definitivo sobre o seu oponente. Vitorioso na manobra, ACM consolidou-se como o principal interlocutor de Jereissati. E isso não está sendo bem digerido pela direção do PFL. Depois de engolir o prato feito, a banda do PFL que não é ACM deu um revide. A escolha do candidato a vice apoiado por Bornhausen, José Jorge (PE), contra o de Antonio Carlos Magalhães, Agripino Maia (RN), mostrou uma bancada carlista isolada na Câmara. A direção conseguiu avalizar junto à maioria da bancada o nome do candidato da direção partidária. Ainda assim, depois de um tempo de bonança onde as lutas internas pelo poder foram relativamente neutralizadas, a disputa mostra que os tucanos conseguiram desequilibrar novamente o ninho do partido aliado. A aliança ACM-Jereissati adia os planos de renovação em curso no PFL - a idéia dos atuais dirigentes era a de, já no próximo ano, dar cara nova à agremiação, tirando dos cargos de direção os antigos quadros, todos eles originários do partido da ditadura, a Arena, depois chamado PDS. É difícil imaginar que isso possa ocorrer agora. O PFL que não queria Alckmin tentava também um consenso interno em torno de um programa econômico que fugisse ao padrão ortodoxo dos governos de FHC e de Lula. O partido tem renovado os seus conselheiros econômicos, atrás de um modelo que não seja o ultra-liberal. Internamente, alguns mitos tem sido derrubados: embora o partido não pense em jogar fora o discurso de austeridade fiscal, discute-se intensamente a validade de uma política tão prolongada de altos superávits fiscais. Políticas de indução do crescimento são vistas com simpatia hoje, mesmo se forem necessárias concessões à ideologia liberal. Da mesma forma, admite-se assumir como programa partidário posições sociais mais flexíveis - como, por exemplo, o fim da contribuição do aposentado para a Previdência Social. Esse debate foge à esfera meramente ideológica: é uma tentativa de estabelecer alguma diferenciação conceitual em relação à política econômica do governo Lula. Líderes envolvidos nesse debate programático temem, ironicamente, que essa discussão esteja mais à esquerda do que suportaria o candidato tucano. Mais do que isso, teme-se que um candidato com pouca formação na área econômica possa não conseguir coordenar um programa consistente que fuja ao padrão dos últimos governos. Há pressões para que Alckmin antecipe seu programa. Sexta-feira, 26 de maio de 2006 Pág. B4 Dinheiro LUÍS NASSIF - O PSDB e a centro-esquerda Está na hora de trazer propostas inovadoras, antes que o partido se transforme em um PFL requentado O PROBLEMA do PSDB não são as eleições de 2006. É o que será do partido depois delas. Aparentemente, os tucanos caíram na armadilha que ajudaram a montar, de ataques ao governo Lula. Tomou-se a nuvem por Juno. Houve uma leitura equivocada, de confundir o antilulismo de parte da opinião pública com um neoconservadorismo radical, grosseiro, sem credibilidade que grassou em parte da opinião pública midiática. Ora, o eleitorado tucano nunca foi conservador, sempre manteve um diálogo amistoso com entidades de direitos humanos, condenava acerbamente o modelo de segurança pública de Paulo Maluf, adotava um discurso não-dogmático em relação à economia, defendia a profissionalização do setor público, a inclusão social sem paternalismo. Principalmente exercitava um discurso não-radical, respeitoso, em torno de idéias. Ou seja, ocupava inconteste o campo centro-esquerda progressivo e não-dogmático, modernizante e fora dos parâmetros de agressividade da política tradicional. O problema da candidatura Geraldo Alckmin não foi apenas o da falta de idéias e de peso específico do candidato, mas como conseqüência de uma pefelização perigosa do PSDB -muito bem apontada pela colunista do "Valor" Maria Inês Nassif na edição de ontem. O PSDB está gradativamente abandonando sua base histórica e disputando o eleitorado do PFL -se situam aí, segundo a analista, os conflitos entre ambos os partidos. O PFL cumpre adequadamente seu papel de representar o eleitorado mais conservador. No entanto, quem fala hoje pelo PSDB? Em lugar da visão de Brasil de José Serra, a truculência de Tasso Jereissati, de Arthur Virgílio; em lugar das formulações do Instituto Sérgio Motta, a política de segurança de Saulo de Castro Abreu/Geraldo Alckmin, com toda sua dose de ineficiência. A própria falta de atuação dos caciques do partido nos conflitos do PCC mostra essa perda de rumo. Está certo que períodos eleitorais não são dos mais adequados para demonstrações de autocrítica. Mas, ao menos, devia-se sinalizar a seus simpatizantes que o partido mantém uma visão mais sofisticada e menos troglodita de segurança. Com esses impasses, ocorre um processo curioso. Os quadros radicais saíram do PT e fundaram suas próprias agremiações. As denúncias afastaram da linha de frente as lideranças petistas mais marcadas pelas denúncias. Esse afastamento abre espaço para o crescimento de novas lideranças, não maculadas pelas denúncias do mensalão, como o governador do Acre, Jorge Viana, o prefeito de Recife, João Paulo, o de Belo Horizonte, Fernando Pimentel, todos com perfil moderado, de centro-esquerda. E o PSDB que tem as idéias e a liderança de José Serra, os estudos de Nakano e Bresser, o Instituto Sérgio Motta, os irmãos Mendonça de Barros, a visão de inovação de um Pacheco, de saúde de um Barjas, fala po meio de um Tasso e sua truculência explícita ou de um FHC e sua tropa de choque refinada. Está na hora de reavivar idéias, de trazer propostas inovadoras, antes que o partido se transforme em um PFL requentado. @ - Luisnassif uol.com.br