Pat, que texto looooongo! Quando ouço falar no Gikovate, o que me vem em mente é sempre este outro texto mais antigo dele, mas igualmente interessante quando o assunto é solidão versus relacionamento, casamento, imposição social sobre isso etc e tal. Lá vai, como retribuição (pelo menos é menorzinho)... (risos) Patricia Kelly. ________________________ Sobre estar sozinho. (Flávio Gikovate, médico psicoterapeuta.) Não é apenas o avanço tecnológico que marcou o inicio deste milênio. As relações afetivas também estão passando por profundas transformações e Revolucionando o conceito de amor. O que se busca hoje é uma relação compatível com os tempos modernos, na qual exista individualidade, respeito, alegria e prazer de estar junto, e não mais uma relação de dependência, em que um responsabiliza o outro pelo seu bem-estar. A idéia de uma pessoa ser o remédio para nossa felicidade, que nasceu com o romantismo está fadada a desaparecer neste início de século. O amor romântico parte da premissa de que somos uma fração e precisamos encontrar nossa outra metade para nos sentirmos completos. Muitas vezes ocorre até um processo de despersonalização que, historicamente, tem atingido mais a mulher. Ela abandona suas características, para se amalgamar ao projeto masculino. A teoria da ligação entre opostos também vem dessa raiz: o outro tem de saber fazer o que eu não sei. Se sou manso, ele deve ser agressivo, e assim por diante. Uma idéia prática de sobrevivência, e pouco romântica, por sinal. A palavra de ordem deste século é parceria. Estamos trocando o amor de necessidade, pelo amor de desejo. Eu gosto e desejo a companhia, mas não preciso, o que é muito diferente. Com o avanço tecnológico, que exige mais tempo individual, as pessoas estão perdendo o pavor de ficar sozinhas, e aprendendo a conviver melhor consigo mesmas. Elas estão começando a perceber que se sentem fração, mas são inteiras. O outro, com o qual se estabelece um elo, também se sente uma fração. Não é príncipe ou salvador de coisa nenhuma. É apenas um companheiro de viagem. O homem é um animal que vai mudando o mundo, e depois tem de ir se reciclando, para se adaptar ao mundo que fabricou. Estamos entrando na era da individualidade, o que não tem nada a ver com egoísmo. O egoísta não tem energia própria; ele se alimenta da energia que vem do outro, seja ela financeira ou moral. A nova forma de amor, ou mais amor, tem nova feição e significado. Visa à aproximação de dois inteiros, e não a união de duas metades. E ela só é possível para aqueles que conseguirem trabalhar sua individualidade. Quanto mais o indivíduo for competente para viver sozinho, mais preparado estará para uma boa relação afetiva. A solidão é boa, ficar sozinho não é vergonhoso. Ao contrário, dá dignidade à pessoa. As boas relações afetivas são ótimas, são muito parecidas com o ficar sozinho, ninguém exige nada de ninguém e ambos crescem. Relações de dominação e de concessões exageradas são coisas do século passado. Cada cérebro é único. Nosso modo de pensar e agir não serve de referência para avaliar ninguém. Muitas vezes, pensamos que o outro é nossa alma gêmea e, na verdade, o que fizemos foi inventá-lo ao nosso gosto. Todas as pessoas deveriam ficar sozinhas de vez em quando, para estabelecer um diálogo interno e descobrir sua força pessoal. Na solidão, o indivíduo entende que a harmonia e a paz de espírito só podem ser encontradas dentro dele mesmo, e não a partir do outro. Ao perceber isso, ele se torna menos crítico e mais compreensivo quanto às diferenças, respeitando a maneira de ser de cada um. O amor de duas pessoas inteiras é bem mais saudável. Nesse tipo de ligação, há o aconchego, o prazer da companhia e o respeito pelo ser amado. Nem sempre é suficiente ser perdoado por alguém, algumas vezes você tem de aprender a perdoar a si mesmo... PS: Caso tenha ficado curioso(a) em saber o significado de SAWABONA, é um cumprimento usado no sul da África quer dizer "EU TE RESPEITO, EU TE VALORIZO, VOCÊ É IMPORTANTE PRA MIM". Em resposta as pessoas dizem SHIKOBA que é "ENTÃO EU EXISTO PRA VOCÊ" (Flávio Gikovate, médico psicoterapeuta.) 2009/10/16 Patricia Borges de Carvalho <pcborges@xxxxxxxxxxxx> > > > *O amor e o casamento - Parte 3 > :: Flávio Gikovate <instituto@xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx> ::* > > *Obstáculos* > > Eu gostaria de me dedicar agora à análise do que penso serem os maiores > obstáculos à felicidade sentimental e, portanto, conjugal. Já ficou claro o > que eu queria passar, que é a noção bastante evidente de separação entre > sexo e amor e entre amor e casamento: o amor é um encantamento e o casamento > é uma sociedade – o encantamento é apenas um dos critérios que pode definir > a sociedade. > > No passado, o critério era apenas racional. Nesses últimos anos, ele tem > sido puramente sentimental e a minha proposta é que seja misto – para quem > deseja se casar. E não há antagonismo nisso. Posso perfeitamente me encantar > por uma pessoa que seja também razoável dos pontos de vista lógico e > prático, viável para a vida em comum, ou seja, com maior maturidade, já que > eu me encanto por pessoas mais parecidas comigo, o que significa > desenvolvimento pessoal. Enquanto eu não estiver feliz como sou, de nada > adianta dizer: me amo ou devo me amar. Só me contentarei com a minha maneira > de ser ao conseguir ser próximo do que considero ideal. Ninguém sentir-se-á > intimamente feliz caso não se pareça com aquilo que valoriza nos seres > humanos. Não há chance de se enganar. Pode até tentar iludir os outros, como > fazem os narcisistas, porém, conhecem a verdade e jamais poderão se aceitar > como são. Por isso o trabalho é longo e penoso; o indivíduo precisa evoluir > para realmente aceitar as suas limitações, conhecer-se e trabalhar > seriamente no seu processo de crescimento se quiser elevar a auto-estima. E > aí a tendência será para se encantar com pessoas parecidas e também para que > esse encantamento seja compatível com as necessidades práticas da relação > conjugal. > > Uma das maiores dificuldades para uma boa vida conjugal tem a ver com a > inveja, que é um sentimento muito pouco estudado. Na verdade, quem mais > estudou a emoção em nosso meio foram os umbandistas, pais-de-santo e outras > pessoas ligadas a esse tipo de religião, onde o tema fundamental foi sempre > a inveja. Os profissionais de psicologia não gostam de temas como inveja e > vaidade, a não ser que sejam vistos de passagem; ou usam os termos como se > fossem claros e conhecidos em suas nuanças por todas as pessoas. Essa não é > a minha posição. Para mim, a inveja é um elemento importantíssimo que deriva > também da admiração, como o amor. Ninguém vai invejar alguém que não seja > rico em qualidades, mas sim por admiração, do mesmo modo que amamos porque > admiramos. Só que a sensação de inveja é de humilhação: o indivíduo sente-se > inferiorizado ao se comparar com as qualidades da outra pessoa, ferido na > sua vaidade e, por isso mesmo, com tendência a desenvolver uma reação de > raiva, agressividade e revolta contra aquele que lhe provoca a inveja. > > Então, quanto maiores as diferenças entre as pessoas que se unem, maior o > ingrediente de inveja, que competirá com o amor. Portanto, a inveja estará > presente na relação com força igual ou maior que o amor; na verdade, maior > que o amor nas relações entre opostos, definindo esta posição que todos > conhecem: as pessoas ficam juntas, brigam muito, mas não se separam, porque > se admiram e se odeiam ao mesmo tempo por não possuírem os valores que tanto > admiram uma na outra. O outro é tão rico no que não se tem... Por exemplo: > se para uma pessoa tímida, que se casa com outra extrovertida, ser tímida > lhe é penoso, a sua tendência é ter uma intensa inveja desta criatura. E > todo tímido acha isso, porque, na psicologia americana dos últimos quarenta > anos, a extroversão passou a ser qualidade, embora não fosse essa a opinião > de Schopenhauer; para ele, o extrovertido é o indivíduo que não agüenta o > tédio de ficar consigo mesmo. > > A tendência da inveja é agressiva, é sabotagem, é tentar derrubar o outro, > é fazer mal ao outro. E essa relação define aquilo que podemos chamar de > "inimigos íntimos", que são a grande maioria das relações conjugais onde há > briga, tensão, ações para sabotar, minar e destruir, às vezes a pretexto de > ciúme, o qual é usado até para encobrir a inveja. Mas é importante lembrar > que nem tudo é ciúme. Muito daquilo que se diz ser ciúme é inveja. Por > exemplo: *não querer que o outro vá aqui ou ali não é só por medo de ele > fazer isso ou aquilo, mas porque só o fato de ele fazê-lo já é suficiente > para me deixar aborrecido, pois estará fazendo aquilo que eu gostaria de > fazer. > * > É preciso registrar, ainda, que existe um outro fator que ativa muito a > questão da inveja: a imaturidade; quer dizer, o tipo humano mais narcisista, > cujo perfil se define fundamentalmente como o tipo extrovertido, egoísta, > agressivo, intolerante a frustrações, a arbitrariedades e invejoso, porque > tem de si uma péssima avaliação. A maior prova de que ele não se ama é a > enorme inveja que sente; são muito mais ferinos, maldosos e profundamente > invejosos porque sabem que são um blefe! Nas relações entre opostos, quase > sempre um é mais egoísta, mais narcisista, enquanto que o outro é mais > generoso, "panos quentes", tolerante a contrariedades e, ao mesmo tempo, > mais tímido, mais quieto e que também tem de si – principalmente no período > da adolescência – um juízo muito negativo. Porém, o mais generoso tem uma > inveja menos ferina, menos malvada, menos destrutiva; talvez sofra mais, mas > é menos maldoso no sentido de agir para derrubar o outro. Então, um dos > ingredientes que torna a inveja mais terrível é a imaturidade emocional do > narcisista. > > Desde 1980, em meu livro Em Busca da Felicidade, faço severas restrições à > generosidade. Mas ela é, sem dúvida, um passo adiante em relação ao egoísmo, > que é uma coisa meio subumana. É o homem sem razão, sem lógica, querendo só > cuidar do que é seu, exatamente como qualquer animal. E o generoso é meio > sobre-humano. Ele "passa do ponto", fica mais para santo do que para humano; > certamente, um reforça o outro, formando uma associação que chamo de "amor > entre opostos", amor por diferenças e que Erich Fromm, em A Arte de Amar, > denomina de "relação sadomasoquista", sendo que o generoso é o masoquista e > o egoísta é o sádico. Não aprecio esses termos por causa da conotação sexual > que está implícita neles, até porque, para mim, a questão não é sexual. > > Existe um outro elemento ainda que considero muito importante: a inveja > entre os sexos. Freud já falava, em parte, sobre a inveja que algumas > mulheres costumam ter dos homens por causa do pênis. Desenvolvi mais > extensivamente o tema da inveja masculina no meu livro “Homem: Sexo > Frágil?”, que, a meu ver, *é muito maior que a feminina. A grande maioria > dos homens inveja as mulheres. E isso principalmente porque durante o > período da adolescência eles as desejam muito mais do que se sentem > desejados*. Por volta dos 14 anos, eles se apaixonam pelas meninas e elas > praticamente os ignoram, provocando-lhes uma sensação de inferioridade, > rejeição, humilhação, que parece não desaparecer jamais. Fica uma espécie de > espinho engasgado na garganta e que, na minha opinião, está na origem de > todo o machismo; esse prazer masculino de derrubar, agredir, depreciar, > insultar as mulheres é, seguramente, dor-de-cotovelo, a qual deriva dessa > sensação de inferioridade sexual. > > Portanto, há diferenças entre o feminino e o masculino basicamente ligadas > à importância da visão como desencadeadora do desejo sexual. Isso na > adolescência se transforma em algo que os homens sentem como grande > inferioridade. Esta também foi a visão de Freud, cuja observação consta em > uma pequena nota de rodapé em um de seus melhores trabalhos intitulado “O > Mal-Estar na Civilização”, onde deixou um germezinho disso ao dizer que o > que aconteceu com o homem foi a passagem, por força da evolução "genética", > da importância do olfato para a da visão. A partir desse livro comecei a > desenvolver esse aspecto até o limite de sua importância fundamental por não > ser um fato qualquer; a passagem para a visão determina a posição ativa > masculina, o que incomodou muito as feministas nos anos 70, nos Estados > Unidos, e no início dos anos 80 aqui no Brasil; a palavra "ativa" é > registrada pelos homens não como algo que implica superioridade, mas sim > inferioridade, porque ser ativo não é uma vantagem: aproximar-se de uma > mulher e poder ouvir um "não" é uma sensação de risco que não agrada a > ninguém. > > A inferioridade sexual masculina logicamente também está presente na "hora > agá". O homem pode fracassar e o seu fracasso é ostensivo, é público; toda a > cultura machista, curiosamente, louvou as vantagens do homem até para > neutralizar essa inferioridade; isto atrapalhou ainda mais, porque depois > ele não conseguiu corresponder a essa superioridade masculina que a cultura > tanto louvou! Sabem por que? Porque ela é falsa! *O machismo oprime, antes > de tudo, o próprio homem.* Então, na "hora agá" pode não haver ereção. E > como é que fica o homem diante dessa possibilidade o tempo todo? Sentindo-se > cada vez mais inferior. Aliás, quanto mais se louvar uma superioridade que > não existe, mais inferior ele vai se sentir – e obviamente com raiva; mas > não é uma raiva que se origina do nada: é raiva do homem que queria ser > mulher. Há aqueles que sabem disso e aceitam essa verdade mais docilmente – > talvez sejam invejosos menos perigosos. Os homossexuais muitas vezes > ostentam essa postura e no limite disso estão os travestis. Não há muitos > casos do contrário, ou seja, há muito mais homens querendo ser mulher do que > vice-versa (o carnaval é prova disso). Então, são fatos e não hipóteses. A > inveja feminina é menor e não é universal. > > Muitas moças, quando crianças, quiseram ser homem pelas vantagens sociais > que esse fato implica: o menino pode brincar na rua, fazer xixi de pé no > banheiro, na estrada, no carro, etc. Enfim, pequenas vantagens técnicas. Ao > chegarem por volta dos 14 anos – especialmente quando começam crescer os > peitinhos, se tornam mais bonitinhas e os meninos começam a mexer com elas – > se esquecem rapidamente de que queriam ser homem. Agora, o que desejam é > provocar os homens e tê-los nas suas mãos. Pode ser ainda que reste uma > pequena irritação contra os homens, vestígios do tempo da infância, que, em > certas mulheres, se transforma em um desejo de dominação às vezes mais > maldoso, causador de dificuldades sexuais nessas pessoas. A não-aceitação da > condição feminina é coisa importante, mas não é esse o tema aqui. > > Há, ainda, um outro fator ligado a essa escolha entre opostos, comum nos > primeiros anos da mocidade: é o elemento erótico, que muito freqüentemente > puxa para um encantamento entre opostos. *Especialmente na psicologia > masculina, a sexualidade acaba se relacionando à raiva, à agressividade, > mais do que ao amor.* Uma das coisas mais tristes da psicologia masculina > – e uma das mais difíceis da relação homem/mulher – é o fato de que o *desejo > sexual masculino é muito maior quando existe um certo ingrediente de raiva e > não um grande amor. > * > No entanto, no grande encantamento amoroso e, sobretudo, na paixão, a > tendência é para total inibição sexual masculina – pelo menos durante um > certo tempo. Isso deu origem, por exemplo, ao amor romântico nos séculos > XVIII e XIX, quando todos os poetas louvaram o amor verdadeiro como sendo > platônico, ou seja, assexuado, e quando o encantamento amoroso era de tal > importância que o sexual passou a ser rebaixado. Talvez a ternura crescia a > ponto de bloquear o tesão. Mas, no meu entender, o fenômeno é mais > complicado do que isso. *A ternura, quando cresce, corre pelo mesmo > caminho, obstruindo o tesão que se ativa mais pela raiva e pela > agressividade; toda a cultura masculina é nesse sentido. > > *Diga-se a propósito que os próprios palavrões, que são terminologia > basicamente masculina, são o reflexo claro disso: eles definem essa > associação entre sexualidade e agressividade. São termos de conotação > claramente sexuais usados com o intuito agressivo, definindo essa relação > entre sexualidade e agressividade, presente na maior parte dos homens, *e > que sem dúvida pode levar um homem a se encantar por uma mulher que lhe > provoca raiva e, conseqüentemente, tesão e não amor.* E a mulher que > provoca raiva em geral é o oposto dele, o que o irrita muito; pessoas que > agem e pensam de maneira totalmente diversa da nossa acabam provocando > raiva, e essa raiva pode provocar o tesão. E se o elemento erótico for muito > importante na escolha, mais do que o elemento racional e de admiração que > define o amor, pode perfeitamente ser mais um fator que levará a uma escolha > inadequada, que é evidentemente o maior problema das relações conjugais. > > > ATENÇÃO: Se você pretende redirecionar este e-mail, por favor, apague todos > os endereços que aparecem nele. Outra opção de segurança é endereçá-lo no > Cco. Desta forma todos serão preservados. Eu e a campanha contra a > propagação de vírus e de spam agradecemos sinceramente. > > > ------------------------------ > E-mail verificado pelo Terra Anti-Spam. > Para classificar esta mensagem como spam ou não spam, clique > aqui<http://ecp.terra.com.br/cgi-bin/reportspam.cgi?+_d=SCY2NDM2NTk3I3Blcm0hdGVycmEmMSwxMjU1NzA0OTA5LjU3NTY4Ny42MjY3LmNhYnJldG9uLnRlcnJhLmNvbSwzMTU4MA==TerraMail> > . > Verifique periodicamente a pasta Spam para garantir que apenas mensagens > indesejadas sejam classificadas como Spam. > > ------------------------------ > Esta mensagem foi verificada pelo E-mail Protegido Terra. > Atualizado em 16/10/2009 > >