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  • Date: Fri, 7 Oct 2005 10:40:03 -0300

O Fla-Flu das armas
Cuidado. Se você quer o desarmamento, mas acha que a proibição da venda de 
armas vai piorar o problema, prepare-se para ser massacrado pelos homens de 
bem. Eles dirão que você é da "bancada da bala". 
Guilherme Fiuza  (nominimo.com.br)
        
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29.09.2005 |  O fenômeno se repete. Na eleição de 2002, quando Lula foi ungido 
presidente do Brasil, uma situação curiosa se passava em boa parte dos círculos 
mais esclarecidos da população. Quem não votasse em Lula era olhado da cabeça 
aos pés com desconfiança. Fosse colega, namorado, amigo de infância, irmão, 
aquele sujeito tinha algo de muito suspeito, por não querer aderir à corrente 
do bem. Está acontecendo exatamente a mesma coisa agora, na campanha do 
plebiscito sobre venda de armas.

O debate está colocado da forma superficial e fajuta de sempre. Quem vota "sim" 
é contra as armas. Quem vota "não" é a favor das armas. E aí entra a outra lei 
da raça humana que não falha: quanto mais superficial é o entendedor, mais 
intolerante ele se revela; e quanto mais intolerante é o indivíduo, mais 
superficial revela-se o seu entendimento das coisas. Portanto, quem está 
interessado em discutir a fundo o que vai acontecer com o país quando a venda 
de armas de fogo for proibida, recolha-se à sua insignificância e aguarde outra 
oportunidade não-plebiscitária.

No dia em que o debate voltar a ser permitido pelos patrulheiros do bem, seria 
interessante fazer uma distinção fundamental: desarmamento é uma coisa, 
proibição do comércio de armas é outra. Isto é, o sujeito pode querer, desejar, 
sonhar com uma sociedade desarmada, e ao mesmo tempo acreditar que a proibição 
não o aproxima do seu sonho. Será possível? 

O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, militante do "sim", divulgou um 
dado interessante. A campanha pelo desarmamento já reduziu em mais de 40% o 
número de homicídios no estado. Trata-se do mais poderoso argumento em favor do 
"não" - não o "não" advogado pela bancada da bala, pelos boçais, os facínoras e 
as criaturas cheias de ódio e pulsões mórbidas; mas sim o "não" advogado por 
quem acha que jogar as armas no mercado negro será o maior combustível para a 
violência observado no Brasil nas últimas décadas. Portanto, para usar a 
linguagem dos superficiais e intolerantes, será a maior burrice dos últimos 
tempos.

Como um disco arranhado, o debate sobre o voto "não" sempre enguiça no 
argumento de que a população civilizada vai ficar sem defesa contra os bandidos 
armados. Evidentemente não é este o ponto. Jorram estatísticas mostrando que 
quem tem arma em casa acaba, na maioria dos casos, vítima dela. Ou por 
acidente, ou porque o bandido saca primeiro, ou porque ela é roubada e usada 
contra o dono. O mesmo acontece com a arma no porta-luvas, na cintura, em 
qualquer lugar. Não serve, em termos estatísticos, para defender o cidadão de 
bem.

A desonestidade da campanha do plebiscito é fazer crer que o voto "não" é 
necessariamente contra o desarmamento, ou a favor do "direito de cada um 
defender-se como quiser" etc. A pergunta é: o que acontecerá com a vida 
brasileira depois de proibida a venda de armas? De saída, uma rápida 
observação: é permitida a venda de fuzis americanos AR-15 à população civil 
brasileira? Evidentemente que não. Por que, então, o Rio de Janeiro está 
coalhado de fuzis AR-15, nas mãos de qualquer um que puder pagar por eles? 
Porque essas armas existem, foram inventadas um dia pela mente humana, são 
fabricadas regularmente e os fabricantes fecham os olhos, fazem o sinal da 
cruz, pedem desculpas a Papai do Céu e entregam-nas aos contrabandistas.

É exatamente o que vai acontecer com os revólveres, pistolas, espingardas e 
similares, em território brasileiro, com o triunfo do virtuoso "sim". Os 
portadores de armas sensibilizados pela campanha do desarmamento estão se 
desfazendo delas - e continuariam, em número cada vez maior, sem o plebiscito. 
Não porque estejam sendo obrigados, constrangidos ou bloqueados pela lei. Estão 
sendo sensibilizados, educados pela via inteligente da dissuasão. 

Mas há os que não entregaram suas armas, e não as entregarão em tempo algum. 
Assim como há os que continuarão querendo armar-se, em qualquer hipótese, e vão 
procurar a arma onde ela estiver - assim como um fã tarado por Caetano Veloso 
possivelmente pagará ao cambista se os ingressos para o show estiverem 
esgotados; como o viciado ou apreciador de um baseado possivelmente pagará ao 
traficante para fumar maconha (não obstante todas as campanhas positivistas que 
tentam relacioná-lo aos crimes mais brutais da bandidagem); como vários 
empreendedores pagaram a contrabandistas, por anos e anos, para ter 
computadores decentes para suas empresas, driblando a patriótica reserva de 
mercado da informática; como os apreciadores de um bom vinho e/ou os 
alcoólatras crônicos pagaram felizes da vida a Al Capone nos Estados Unidos 
durante a Lei Seca.

No mundo encantado dos patrulheiros do "sim", a proibição da venda de armas vai 
matar o desejo de comprá-las, e fazer evaporar as milhares de unidades de 
fabricação delas. A campanha mundial contra o tabagismo, baseada em informação 
sobre danos e desglamourização do cigarro, feriu de morte a indústria do 
tabaco. Não porque proibiu o fumante de entrar no botequim e pedir um maço de 
Hollywood. Mas porque mostrou a ele que não era exatamente "ao sucesso" que 
aquela droga o levaria. 

Este é o caminho inteligente, civilizado e único para o desarmamento. A 
dissuasão pelo esclarecimento. Mas quando os homens virtuosos estão lambuzados 
em suas boas intenções, não adianta pedir-lhes um dedo de prosa se for para 
contradizê-los. É pena. O bem está prestes a dar ao crime organizado seu grande 
impulso no século que se inicia.

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