[CamaraDas] Interessante artigo combatendo o "SIM"

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  • Date: Thu, 13 Oct 2005 02:46:43 -0300

DEMÉTRIO MAGNOLI

Dois tiros na democracia
DEMÉTRIO MAGNOLI

"Vamos agora ganhar o referendo do desarmamento", declarou o ministro Márcio 
Thomaz Bastos no início de julho, deflagrando uma operação de propaganda 
política de massas que se baseia na manipulação da linguagem. A associação 
entre o referendo e a noção de "desarmamento", junto com a inversão lógica pela 
qual a palavra "sim", carregada de conotações positivas, identifica o voto na 
proibição, formam a plataforma persuasiva engendrada por um governo que 
despreza o esclarecimento dos cidadãos.
O referendo não é sobre o "desarmamento", pois os bandidos não renunciarão às 
armas, qualquer que seja a decisão da maioria. O referendo é sobre o direito de 
vender e comprar, legalmente, armas de fogo. A campanha do "sim" (ou seja, do 
não) atenta contra a liberdade e a igualdade, os dois pilares históricos da 
democracia.
O argumento verossímil de que a proibição reduzirá as vítimas de acidentes 
domésticos e de tentativas de reação armada a assaltos é um tiro no princípio 
da liberdade. O que se propõe é que o Estado tutele os cidadãos, impedindo-os 
de cometer atos imprudentes. Mas, numa sociedade livre, cada um é responsável 
por suas decisões privadas, desde que elas não ameacem a segurança dos outros. 
A campanha do "sim" organiza-se sobre o conceito do Estado tutelar, enraizado 
na tradição patrimonial brasileira e expresso em incontáveis discursos 
presidenciais.
O argumento inverossímil de que a proibição reduzirá as vítimas de conflitos 
interpessoais apóia-se na fraude de interpretação de estatísticas. Acadêmicos 
que ensinam a seus alunos que correlação não significa causação parecem não se 
envergonhar de, na campanha do referendo, interpretar como relação causal uma 
(fraca) correlação entre recolhimento de armas e diminuição de crimes.
A redução de homicídios registrada na última década no Brasil pode ter inúmeras 
causas, entre elas as mudanças na dinâmica demográfica que resultam no 
envelhecimento da população. Essa é, ao menos, a causa geral mais aceita para a 
redução de crimes em diversos países. De qualquer modo, a proposição de que o 
indivíduo que atira no desafeto numa briga de bar não comprará arma no mercado 
negro é um fútil exercício especulativo. O certo é que a proibição ampliará o 
mercado negro de armas e reduzirá o controle do Estado sobre a difusão da 
propriedade de revólveres e pistolas.
Na forma proposta, a proibição da venda de armas não atingirá as empresas de 
segurança privada. Isso significa que os "homens bons", ou seja, fazendeiros, 
grandes empresários, líderes políticos e famosos advogados continuarão a se 
armar legalmente enquanto a plebe está condenada a renunciar às armas ou a 
optar pela contravenção. O "desarmamento" atinge apenas os cidadãos honestos de 
poucas posses, proibindo ao trabalhador, ao motorista de táxi ou ao posseiro o 
recurso, prudente ou não, à autodefesa armada. A nova legislação pela qual se 
empenha o ministro da Justiça é um tiro no princípio da igualdade.
As pesquisas de opinião revelaram sólida maioria alinhada com o "sim". Elas 
refletem o sucesso da estratégia de manipulação de massas e a natural 
repugnância provocada por "argumentos" de brucutus armados como os Bolsonaros 
da vida. Mas também refletem a fragilidade dos princípios da liberdade e da 
igualdade entre nós.

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