[Camaradas/Unalegis] Re: Meu assunto predileto....

  • From: Luís Nobre <luis.cnobre@xxxxxxxxx>
  • To: Analistas <analistas2002@xxxxxxxxxxxxx>
  • Date: Thu, 10 Sep 2009 19:54:22 -0300

Concordo parcialmente. Tudo muda, as pessoas mudam. O homem muda, a mulher
muda, o meio que os cerca muda, para um ou outro ou para ambos. Ganha-se
experiência, você adquire outros prismas, joga outros fora. Prá mim esse
texto me lembrou aquela piada que diz que casamento é como o submarino: pode
até flutuar, mas foi feito mesmo para afundar. Uma pergunta: supondo que
homens e mulheres fossem melhor instruídos/preparados para uma vida a dois
(isso incluiria terapia já na adolescência, leitura de livros e artigos
tratando do assunto, aprender com os erros dos já casados, etc), o número de
laços matrimoniais aumentaria ou diminuiria? E o número de divórcios
daqueles que mesmo sabendo dessa programação (porque é isso que o artigo
abaixo nos diz, ou seja, somos programados a procurar alguém para nos
livrarmos da culpa do fracasso) resolveram contrair (isso é uma doença?)
matrimônio?

abç
Luís



2009/9/10 Patrícia Borges de Carvalho <pcborges@xxxxxxxxxxxx>

> Casamentos possíveis
>
>
> Contardo Calligaris
>
> Em geral, a gente casa com a pessoa certa: com quem podemos culpar por
> nossos fracassos
>
>
> UMA DAS boas razões para se casar é a seguinte: uma vez casados, podemos
> culpar o casal por boa parte de nossas covardias e impotências.
> O marido, por exemplo, pode responsabilizar mulher, filhos e casamento por
> ele ter desistido de ser o aventureiro que ainda dorme, inquieto, em seu
> peito. A decepção consigo mesmo é menos amarga quando é transformada em
> acusação: "Você está me impedindo de alcançar o que eu não tenho a coragem
> de querer".
> Essas recriminações, que disfarçam nossos fracassos, não são unicamente
> masculinas.
> Certo, os homens são quase sempre assombrados por impossíveis devaneios de
> grandeza -como se algum destino extraordinário e inalcançável já tivesse
> sido sonhado para eles (e foi mesmo, geralmente pelas suas mães). Diante de
> tamanha expectativa, é cômodo alegar que o casal foi o impedimento.
> As mulheres, inversamente, seriam mais pé-no-chão, capazes de achar graça
> nas serventias do cotidiano. Por isso mesmo, aliás, elas encarnariam
> facilmente, para os homens, os limites que a realidade impõe aos sonhos que
> eles não têm a ousadia de realizar.
> Agora, as mulheres também sonham. Há a dona de casa que acusa o marido, os
> filhos e o casamento por ela ter desistido de outra vida (eventualmente,
> profissional), que teria sido fonte de maiores alegrias. E há, sobre tudo,
> para muitas mulheres, um sonho romântico de amor avassalador e irresistível,
> do qual, justamente, elas desistem por causa de marido, filhos e casamento.
> Com isso, d. Quixote se queixa de que sua mulher esconde seus livros de
> cavalaria e o impede de sair à cata de moinhos de vento. E Madame Bovary se
> queixa de que seu marido esconde seus livros de amor e a impede de sair
> pelos bailes, à cata de paixões sublimes e elegantes.
> Pena que raramente eles consigam ter os mesmos sonhos. Um problema é que os
> sonhos dos homens podem ser de conquista, mas dificilmente de amor, pois
> eles derivam diretamente das esperanças que as mães depositam em seus
> filhos, e, claro, uma mãe pode esperar que seu rebento varão seja um
> dom-juan, mas raramente esperará ser substituída por outra mulher no coração
> do filho.
> Não pense que esse fogo cruzado de acusações seja causa recorrente de
> divórcio. Ao contrário, ele faz a força do casamento, pois, atrás da
> acusação ("É por sua causa que deixei de realizar meus sonhos"), ouve-se:
> "Ainda bem que você está aqui, do meu lado, fornecendo-me assim uma desculpa
> -sem você, eu teria de encarar a verdade, e a verdade é que eu mesmo não
> paro de trair meus próprios sonhos".
> Ou seja, em geral, a gente casa com a pessoa "certa": a que podemos culpar
> por nossos fracassos. E essa, repito, não é uma razão para separar-se. Ao
> contrário, seria uma boa razão para ficar juntos.
> Quando a coisa aperta, não é porque sonhos e devaneios teriam sido
> frustrados "por causa do outro", mas pelas "cobranças", que, elas sim, podem
> se revelar insuportáveis.
> Um exemplo masculino. Uma mulher me permite acreditar que é por causa dela
> que eu não consigo ser o que quero: graças a Deus, não posso mais tentar
> minha sorte no garimpo agora que tenho esposa, filhos e tal. Até aqui, tudo
> bem. Como compensação pelos sonhos dos quais eu desisti, passo as tardes de
> domingo afogando num sofá e soltando foguetes quando meu time marca um gol,
> mas eis que, no meio do jogo, minha mulher me pede para brincar com as
> crianças ou para ir até à padaria e comprar o necessário para o café - logo
> a mim, que deveria estar explorando as fontes do Nilo ou negociando a paz
> entre os senhores da guerra da Somália.
> Essa cobrança, aparentemente chata, poderia salvar-me da morosa constatação
> do fracasso de meus sonhos e das ninharias com as quais me consolo. Talvez,
> aliás, ela me ajudasse a encontrar prazer e satisfação na vida concreta, nos
> afetos cotidianos. Mas não é o que acontece: o que ouço é mais uma voz que
> confirma minha insuficiência.
> À cobrança dos sonhos dos quais desisti acrescenta-se a cobrança de quem
> foi (ou é) "causa" de minha desistência e razão de meu "sacrifício": "Olhe
> só, mesmo assim, ela não está satisfeita comigo." Em suma, não presto,
> nunca, para mulher alguma -nem para a mãe que queria que eu fosse herói nem
> para a esposa para quem renunciei a ser herói. E a corda arrebenta.
> O ideal seria aceitar que nosso par nos acuse de seus fracassos e, além
> disso, não lhe pedir nada. Difícil.
>
>

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